segunda-feira, 7 de julho de 2008

A MEMÓRIA DOS HOMENS...




A Ignomínia do Esquecimento


Passou, silencioso e despercebido, no dia 1º. deste mês de Julho, o aniversário de nascimento de um cidadão que deveria ser um marco da nossa actual sociedade. Este Homem, licenciado em Ciências Sociais e Políticas e em Ciências Etnológicas e Antropológicas, dotado de um carácter, personalidade, tenacidade e destemor, quase inigualáveis para o seu tempo e idade (29 anos), fez frente, de peito aberto, a blindados comandados pelo único indivíduo que, em desespero, se atreveu a tentar defender o anquilosado e indefensável estado novo e o seu último e indeciso ditador.
Refiro-me ao Cidadão Fernando José Salgueiro Maia, nascido a 1 de Julho de 1944 e desaparecido de entre nós a 4 de Abril de 1992.
O País e o mundo conheceram-no como o Capitão do 25 de Abril, do Terreiro do Paço e do Quartel do Carmo. Mas o seu percurso, como militar e cidadão começou muito antes. Apesar de muito jovem, tinha já cumprido duas comissões na guerra colonial, a primeira em Angola, 1968/70 e a segunda na Guiné, 1971/73. Em ambas o seu carácter se manifestou. Ainda em Angola é promovido a Capitão. Sobre o a Guiné, espero que alguém do seu tempo aqui escreva o que se passou. A camaradagem, coragem e abnegação, encontraram aí terreno e espaço para decisões e acções que o fariam sofrer até ao fim dos seus dias, embora com a tranquilidade de espírito de um dever superior cumprido. A sua entrega em sacrifício de alguns, para o bem de muitos, teve aí o seu grande ensaio. Repete-o em 1974, ao arriscar tudo nas suas decisões firmes e em obediência a um compromisso assumido. As suas palavras na parada da EPC em Santarém, na madrugada de 24/25 de Abril de 74 são a expressão definitiva da sua visão e da sua força interior. Assim se dirigem homens e se conquistam comandados: "Há diversas modalidades de Estado: os estados socialistas, os estados corporativos e o estado a que isto chegou! Ora, nesta noite solene, vamos acabar com o estado a que chegámos. De maneira que quem quiser, vem comigo para Lisboa e acabamos com isto. Quem é voluntário sai e forma. Quem não quiser vir não é obrigado e fica aqui."
Com estas palavras se começa a construir, no terreno, o que se desejava e poderia ter sido uma democracia.
Em 25 de Nov. de 1975, dá-nos outro exemplo de disciplina e obediência, ao voltar saír do mesmo local, da mesma forma, mas desta vez às ordens do Presidente da República.
Nem os políticos nem a maioria dos seus pares lhe perdoa a forma de ser, a voluntariedade e a verticalidade. Nesta sequência é transferido para os Açores, só voltando em 1979, para a "honrosa distinção" de comandar o Presídio de Santa Margarida. Só em 1984 voltará à "sua" EPC em Santarém.
Como é da "práxis" nesta espécie de país, somente em 1983 é agraciado com a Grã Cruz da Ordem da Liberdade (de que foi um dos principais mentor e autor). Morre em 1992, aos 48 anos de idade e a 21 dias da comemoração do 18º. aniversário da "sua" Revolução, após dois longos anos de sofrimento, sendo ainda em 1992, mas já a título póstumo, elevado a Grande Oficial da Ordem da Torre e Espada.
Na ausência de efeméride nacional condigna, "para que a memória se não apague", aqui fica a homenagem singela e simples, na pureza da amizade, como ele gostava.
Até sempre Maia.
Jerónimo Sardinha.

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