1985




Sou capitão do Exército, quase major, trabalho há 15 anos, acabo de comprar
 um T2,e sou pai. Nasce o meu filho  João. Não nasceu em berço de oiro. 
Nasceu numa casa praticamente sem móveis, mas com um globo junto
 de si, para saber, sempre, que por mais pequeno e despido, ou maior e
 cheio de coisas que fosse o seu terreiro, o seu berço, a sua casa, 
o Mundo seria sempre, sempre, muito maior.

E, assim, sempre foi ensinado que havia casas e  barracas, onde , outros viviam,
 havia Lisboa, Alentejo, Madeira, África e Ásia, e que o facto dele ter nascido 
em Lisboa, ser filho de uma alentejana, que conheci em Lisboa e de um
 madeirense são os acasos felizes da vida, mas que outros, embora o 
nascimento seja sempre uma felicidade, ainda nasceram em casas mais
 despidas que a nossa, e, outros ainda,  nasceram entre o cair de uma 
granada e outra, atrás de penhascos, e uns sobreviveram e
outros não.

Por vezes, pensa-se que alguns, por força dos supostos estatutos sociais
 dos pais nascem de dado modo, mas nem sempre é assim, com o meu 
filho não foi assim, para dar a entrada faseada para a casa, na medida 
em que os depósitos a prazo iam terminando, tive de habitá-la sem 
móveis para além das camas para dormirmos e o berço para o nosso filho.

Coisas... mas que  no fundo são uma grande lição de vida e muita honra.

Sobrevivemos e a casa foi-se enchendo, mas ainda tem uma televisão
 de 1998, não recebeu nenhum plasma, embora já tivesse pensada a 
sua aquisição, mas não aconteceu.

 Nesta casa, sempre se praticou uma severa austeridade, nada se
 comprou com cartões de crédito, para além da capacidade do rendimento
 disponível, ou seja, dos nossos magros vencimentos, apesar de, segundo
 o governo de Cavaco da Silva, em 1990, ser dos 6% mais elevados, em 
sede do IRS, conforme resposta que me foi dada às minhas reclamações….

Coisas….


andrade da silva