quarta-feira, 12 de novembro de 2008

UM GRITO DE DESESPERO

Pelo opróbio que representa, pelo humilhante que é, pela indignação que sinto, reproduzo a carta abaixo, sem mais comentários.
Não receberá tratamento de texto, porque não o precisa e acima de tudo nao o mereceria.
Peço que pensem, todos, todos nós, se foi para isto que quisemos uma coisa chamada DEMOCRACIA.
Pelo menos, saibamos ser dignos dela.





... militares portugueses derrubaram ...


Exmº Sr. Presidente da República

V. Ex.ª não me conhece, sou apenas mais uma cidadã, esposa, mãe, portuguesa e trabalhadora. Sou esposa de um militar das Forças Armadas Portuguesas.
Nunca quis saber de politiquice, nem sou sensível a estas áreas que pouco ou nada me dizem.
Há cerca de um mês, uma situação tocou a minha sensibilidade feminina. Um colega do meu marido, um Sargento do quadro permanente das Forças Armadas, levava uma vida normal, numa família normal. Quis o destino que esse militar fosse operado a um cancro. Heroicamente, como que a fazer jus ao seu espírito militar, rapidamente recuperou, após ter superado um ataque cardíaco e a morte de um familiar.
Poucos meses depois, veio o golpe fatal: à esposa, na casa dos 40 anos de idade, foi-lhe diagnosticado um cancro de difícil solução.
A vida normal, sem luxos que nunca tivera, nem privilégios apontados por quem ignora a realidade do que é ser militar, perdeu sentido.
O meu marido e outros colegas de trabalho, aperceberam-se que o infortunado Sargento no activo, não dispunha de 150 € para adquirir fraldas que contivessem a sua incontinência urinária. O choque emocional misturou-se à revolta pelo facto do Estado não apoiar um militar no activo, Sargento, que jurou defender a sua PÁTRIA mesmo com sacrifício da própria vida.
Num acto de sã camaradagem, descobriram o seu NIB e rapidamente entre todos, conseguiram fazer depósitos - donativo, caridade, como lhe queiram chamar - de modo a que não passasse privações imediatas nem ele, nem a esposa doente, nem os filhos em idade escolar. O célebre sistema de apoio à doença dos militares (ADM), que alguns ou porque desconhecem ou porque são maldosos, dizem ser uma regalia e um privilégio, está a dever as comparticipações a este Sargento, no activo, desde Março, forçando-o a passar cheques pré-datados que são aceites, graças ao facto de ser conhecido na sua localidade como pessoa de bem, honesta e trabalhadora.

Sr. Presidente da República, V. Ex.ª é a única esperança neste país onde se perdeu a esperança nos políticos, pois que poucos são os que os levam a sério.

Sr. Presidente da República, V. Exª é o Comandante Supremo das Forças Armadas e decerto que saberá tomar uma decisão que o legitime perante os seus homens como tal.

É revoltante ver os militares continuarem a ser achincalhados, ignorados, usados e terem de recorrer à caridade entre eles próprios.

Sr. Presidente da República, não seria mais digno, mais honesto, acabar com as Forças Armadas?

Mal vai um país onde o poder político ignora as suas forças armadas, não as defende, faz discursos de circunstância e deixa-as na realidade ao abandono.
Será legítimo esperar que esses militares que entregaram o poder aos civis e que pacientemente vêem tantos desmandos, fiquem calados e quietos?
quero acreditar que V. Exª será o catalizador da esperança, da resolução imediata de problemas gravíssimos que os militares estão a passar, como dificuldades, cortes na comida, cortes em tratamentos, atirando-os para o abismo do desespero...

Maria Antónia Freitas
(Leiria)

3 comentários:

andrade da silva disse...

Deixaram para trás um camarada doente, abandonado à sua desdita, isto é INSUPORTÁVEL, INACEITÁVEL, INTOLORÁVEL.

Foram atingidos os pilares mais sólidos da camaradagem e da dignidade militar e humana, nada mais pode ficar como antes. ALGUÉM ABANDONOU UM OU QUANTOS CAMARADAS À SUA SORTE.

Todos e concretamente a AOFA E ANS têm de interpelar o Governo, a Instituição Militar e o Chefe Supremo das Força das Armadas sobre este e todos os demais casos idênticos que possam existir.

Este caso e todos os semelhantes contundem com valores morais, humanos e de camaradagem que são o fundamento último da coesão e da essência das Forças Armadas, para além de desrespeitarem Direitos e Garantias Constitucionais e dos Direitos Humanos.

Este caso e todos os demais que aconteçam na nossa sociedade SÃO IMORAIS E, CONSEQUENTEMENTE, INACEITÁVEIS.

andrade da silva

José-Augusto de Carvalho disse...

Lida esta carta, mais uma vez me deparo com o país real, com este Povo-País sujeito a todas as agressões de uns quantos que nos desgovernam em nome de um Povo-País que o elege e o atura com uma resignação tão dorida que mais parece uma maldição.
Várias vezes aqui tenho afirmado entender que o Povo-País é um só e que os militares emanam deste mesmo Povo-País. De novo o reitero.
Exactamente por isto, é uma afronta o Poder Político pouco ou nada fazer para eliminar situações que ofendem a dignidade humana.
Quando se vivia sob a batuta salazarenta, todos poderiam argumentar que o regime autoritário governava pela força, isto é, sem a legitimação popular; mas hoje, há 32 anos, quem nos malgoverna está legitimado pelo voto popular. Por isto me interrogo como insiste este povo em eleger quem os maltrata, quem os ignora, quem os ofende.
Civilizadamente, não estaremos em época de golpes e contragolpes, mas estaremos, necessariamente, imperiosamente em época de, todos juntos, dizermos não, nunca mais!
Abraços.
José-Augusto de Carvalho

Jerónimo Sardinha disse...

Estamos, estamos,
Caro ZÉ-Augusto. Estamos em plena época de golpes e contra-golpes.
Senão, vejamos:

O que se passa com os militares e isto é um pequeno pano de amostra, está, como muito bem sabe, mais agravado na sociedade civil.
Basta ouvir o que dizem organizações como a AMI e a DECO, para perceber como realmente estamos.
Segundo aquelas organizações, já são, discretamente, abordados por familiares de médicos, advogados, outros licenciados, sargentos e oficiais, no sentido de lhe ser prestada assistência, pelo menos ao nível do comer quotidiano e do modo de fazer face a encargos assumidos, para os quais já não têm capacidade de resposta.
Se uma sociedade se apresenta assim, se não estamos em época de golpes, estaremos em época de quê ?

Será que Andrade da Silva tem razão e estamos mesmo ajavardados, emporcalhados, a caminho do chiqueiro, sorridente e prazenteiramente ?

Que somos um povo cobarde, invejoso e com tendência delatora, há muito que não restam dúvidas!
Que a maioria se rasga e rasteja por uma migalha daqueles que lhe sugam o sangue, batendo palmas e exercendo violência gratuita quer em familiares, quer em seres mais fracos e débeis, também não restam dúvidas. Televisões e jornais "dixit".
Não me chamem nomes, pois não invento nada! Limito-me a ouvir bem e ler melhor. Para não dizer que me deparo com esse degradante espectáculo, diariamente, diante dos olhos.

Agora que estamos em época de golpes, estamos. Senão, como chama à "nacionalização" anunciada?
Senão, que chamar aos preços da electricidade, da água, dos combustíveis, dos géneros de primeira ou de absoluta necessidade?

Até estamos em época, de nos unirmos e pedir contas a quem nos desgoverna há 35 anos, nos rouba descaradamente e ainda nos penaliza, rotulando-nos de ladrões. De quem favorece, com o nosso dinheiro, aqueles que nos exploram no dia a dia, bramando que ao povo fazem um favor.

Está na altura de dar um golpe, profundo, nisto tudo, começando a produzir o que consumimos, devolvendo o que nos impingem a alto custo e sem qualidade.

Está em época de impor um modo de vida são e honesto, acabando com o descaramento dos salários de miséria versus salários bilionários.

Está em época de termos vergonha do que temos sido e do que temos permitido.

A meia dúzia que esteve insatisfeita com a ditadura fascista, no geral muito mais branda do que este capitalismo selvagem, ainda está viva e forte e capaz de voltar a lutar. Por si e pelos cobardes, para que todos possam ter uma vida digna, justa e decente.

Por aqui me fico, com um abraço fraterno,
Jerónimo Sardinha