domingo, 12 de julho de 2009

Ò ALENTEJO




Reflexão literária

Ò Alentejo !



Que marca imprimes em quem nasce no teu seio!
A beleza agreste da tua paisagem, a sã convivência, teus costumes e tradições cedo inspiraram poetas como Sá de Miranda, Florbela Espanca, Macedo Papança (conde de Monsaraz) ..., escritores como Fialho de Almeida, Manuel da Fonseca, Hernâni Cidade, dramaturgos como Bernardim Ribeiro, historiadores como Túlio Espanca, pedagogos como Manuel Patrício.

Influenciaste igualmente romancistas que não sendo Alentejanos de nascimento, por circunstâncias da vida, aí algum tempo viveram. Estou a lembrar-me de Eça de Queiroz, José Régio, Vergílio Ferreira.

Outros como José Saramago sentiram um apelo interior e lá foram buscar inspiração.

Que dizer da música, dos cantares, enfim dum povo que fala verdadeiramente a cantar!
Fiel a esta tradição, Alentejana de nascença, Maria de Deus Melo, escreve um poema logo com ideia da música. Muitas vezes ao acabar de o escrever, recita-mo ao telefone cantando.

Não se queda indiferente à dureza da vida humana como o atesta o poema “O cavador” feito de recordações do mundo da sua infância.

“...cavas palmo a palmo desgraçado
o chão que nem é teu,
para teres um bocado de pão
o pouco que o homem te deu.
Depois de velho e cansado
esse pobre coração destroçado
em troca do seu tormento,
pedirá à terra a paz, o esquecimento!”

recorda-me Fialho de Almeida:

“Nestas terreolas mesquinhas, entre o cavador que estanca a vida à enxadada, ganhando apenas com que morrer de miséria, e o homem rico que pavoneia em berlinda de correias o estadão dos seus quarenta contos de hortejos e farejais;

Fialho de Almeida in “O País das Uvas”

Enfim o amor, no seu sentido trágico como recitava Demócrito “Aparência a cor, aparência o doce, aparência o amor: na realidade só os átomos e o vazio”; a lembrar Florbela Espanca num misto de tragédia e sensualidade, embebida numa certa religiosidade. A própria o reconhece num poema intitulado “Homenagem a Florbela Espanca”:

Nasci sagitária como tu
o Alentejo a arder no coração,
amor puro e alma a nú
fomos loucas no amor e na paixão.

Infelizes e incompreendidas
gritando ao mundo toda a verdade,
como se unissem em nossas vidas
a tua e a minha infelicidade.

Especial relevo, dedica a poetisa à cidade de Évora, a antiguidade das suas pedras, as belas arcadas, oferecem cenário ideal para o amor e a paixão, como refere na quadra:

Visitámos o templo de Diana
de mãos entrelaçadas de ternura,
que pouco foi o tempo p´ra quem ama
para hoje ter tanta desventura.

Tal visão tende a provocar um confronto entre o finito e o infinito levando a questionar a própria existência.

Vergílio Ferreira no seu romance “A Aparição” descreve igualmente o êxtase que lhe provoca ao chegar a esta cidade, a visão súbita do templo de Diana.

“Templo de Diana. Só nessa noite o vi bem, nessa noite de Setembro, lavado de uma grande Lua - raios imóveis de uma oração mutilada, silenciosa imagem do arrepio de séculos ...”

Numa outra passagem da mesma obra escreve:

“Évora mortuária, encruzilhada de raças, ossário dos séculos e dos sonhos dos homens,, como te lembro, como me dóis!”

Estamos então perante aquele que no fundo é o drama humano, a angústia do homem perante a sua finitude, que o leva a questionar o bem e o mal, o Deus e o Diabo, tema para o “Cântico Negro” de José Régio.


Alentejo não deixes de inspirar os Poetas.
Onde existe algo de eternidade
é na poesia,
Aquilo que o tempo não corrói,
Nem destrói,
Vital sopro de eternidade,
Para lá da bondade e da maldade.






Filipe Papança*

·
Licenciado em Matemática Aplicada, Mestre em Estatística e Gestão de Informação. Professor na Academia Militar
· Prefácio do livro de poesia de Maria de Deus Melo: "Alentejo Profundo Um Rol De Esperanças" - publicado pela Universitária Editora.

PS: Pelo grande entusiamo que o Alentejo despertou, o nosso amigo Filipe oferece-nos mais um belo texto,o que muito agradecemos.
asilva


1 comentário:

Marília Gonçalves disse...

Compositor(es): Bento Caeiro / Joao Camilo

magistralmente interpretada por DULCE PONTES

Eu não sei que tenho em Évora
Que de Évora me estou lembrando
Quando chego ao rio Tejo
As ondas me vão levando

Abalei do Alentejo
Olhei para trás chorando
Alentejo da minh'alma
Tão longe me vais ficando

Ceifeira que andas à calma
Ai, à calma, ceifando o trigo
Ceifa as penas da minh'alma
Ceifa-as e leva-as contigo

que pena nao poder trazer até aqui esse timbre ímpar que me traz à lembrança a cançao com que meu pai me embalava, menina
BEM HAJA, pela doçura que em mim desperta, hoje mais que nunca
fraterna

Marilia Gonçalves