sábado, 24 de outubro de 2009

NATÁLIA CORREIA




Numa clara demonstração do seu carácter irreverente, veja- se a resposta de Natália Correia ao deputado João Morgado (CDS), em 1982 no Assembleia da República, na sequência de um "eloquente" discurso daquele: «A igreja Católica proíbe o aborto, porque entende que o acto sexual é para se ver o nascimento de um filho». Ao que Natália Correia, ao tempo deputada do PSD, ripostou:



Já que o coito diz Morgado
tem como fim cristalino,
preciso e imaculado
fazer menino ou menina
e cada vez que o varão
sexual petisco manduca,
temos na procriação
prova de que houve truca, truca,
sendo só pai de um rebento,
lógica é a conclusão
de que o viril instrumento
só usou parca ração! Uma vez.
E se a função faz o órgão diz o ditado
consumado essa excepção,
ficou capado o Morgado.






A Defesa do Poeta



"Senhores jurados sou um poeta
um multipétalo uivo um defeito
e ando com uma camisa de vento
ao contrário do esqueleto.
Sou um vestíbulo do impossível um lápis
de armazenado espanto e por fim
com a paciência dos versos
espero viver dentro de mim.

Sou em código o azul de todos
(curtido couro de cicatrizes)
uma avaria cantante
na maquineta dos felizes.
Senhores banqueiros sois a cidade
o vosso enfarte serei
não há cidade sem o parque
do sono que vos roubei.

Senhores professores que pusestes
a prémio minha rara edição
de raptar-me em crianças que salvo
do incêndio da vossa lição.

Senhores tiranos que do baralho
de em pó volverdes sois os reis,
sou um poeta, jogo-me aos dados
ganho as paisagens que não vereis.

Senhores heróis até aos dentes
puro exercício de ninguém,
minha cobardia é esperar-vos
umas estrofes mais além.

Senhores três quatro cinco e sete
que medo vos pôs por ordem?
que pavor fechou o leque
da vossa diferença enquanto homem?

Senhores juízes que não molhais
a pena na tinta da natureza,
não apedrejeis meu pássaro
sem que ele cante minha defesa.

Sou um instantâneo das coisas
apanhadas em delito de perdão
a raiz quadrada da flor
que espalmais em apertos de mão.
Sou uma impudência a mesa posta
de um verso onde o possa escrever
Ó subalimentados do sonho!
a poesia é para comer.


Comentário de um leitor, a quem, muito agradeço. Muito Obrigado.
CARA AMIGA E AMIGO LEITOR NÃO DEIXEM DE LER EM COMENTÁRIOS A ODE AOS POETAS, DE MIGUEL TORGA.
asilva

4 comentários:

Anónimo disse...

Ode aos Poetas - Miguel Torga

in "Odes", 1946; "Poesia Completa", 2000)





Somos nós

As humanas cigarras!

Nós,

Desde o tempo de Esopo conhecidos...

Nós,

Preguiçosos insectos perseguidos.



Somos nós os ridículos comparsas

Da fábula burguesa da formiga.

Nós, a tribo faminta de ciganos

Que se abriga

Ao luar.

Nós, que nunca passamos

A passar!



Somos nós, e só nós podemos ter

Asas sonoras.

Asas que em certas horas

Palpitam.

Asas que morrem, mas que ressuscitam

Da sepultura!

E que da planura

Da seara

Erguem a um campo de maior altura

A mão que só altura semeara.



Por isso a vós, Poetas, eu levanto

A taça fraternal deste meu canto,

E bebo em vossa honra o doce vinho

Da amizade e da paz!

Vinho que não é meu,

Mas sim do mosto que a beleza traz!



E vos digo e conjuro que canteis!

Que sejais menestréis

Duma gesta de amor universal!

Duma epopeia que não tenha reis,

Mas homens de tamanho natural!



Homens de toda a terra sem fronteiras!

De todos os feitios e maneiras,

Da cor que o sol lhes deu à flor da pele!

Crias de Adão e Eva verdadeiras!

Homens da torre de Babel!



Homens do dia-a-dia

Que levantem paredes de ilusão!

Homens de pés no chão,

Que se calcem de sonho e de poesia

Pela graça infantil da vossa mão!

andrade da silva disse...

Muito, muito Obrigado, por tão oportuna selecção, embora tanto tempo e tanta coisa nos separe por um lado desses longinquos anos de 1946, e, por outro, parece haver um abismo que nos aproxima.

abraço
asilva

Anónimo disse...

Gostaria de entrar em contacto com o coronel andrade da silva



SOU FILHO DA SUA PRIMA DE LOIVO, MARIA DA GLORIA SILVA ARAUJO.
O PRIMO TALVEZ JÁ NÃO SE RECORDE, NO ANO 1994, FALAMOS AO TELEFONE, QUANDO EU ESTAVA A CUMPRIR O SERVIÇO MILITAR.PASSADOS ESTES ANOS TODOS, DESCOBRI NA INTERNET QUE ESCREVE PARA ALGUNS BLOGS, ONDE MUITO ME ALEGREI E FAZIA MUITO GOSTO DE ENTRAR EM CONTACTO COM O PRIMO. JÁ TENTEI TELEFONAR P/ O NUMERO QUE A MINHA MÃE TINHA, MAS NÃO ESTA ATRIBUIDO. MEU CONTACTO 962689540 E 251709200 email: paulosobrosa@sapo.pt.
UM ABRAÇO ATÉ BREVE

andrade da silva disse...

Bem
Eu já mandei um e-mail para o que referes e já telefonei, para o numero referido, mas não consegui entrar em contacto contigo.

abraço
asilva