" Aos Mineiros do Chile e a todos os que, estoicamente, se ultrapassam, para sobreviverem e fazerem que o mundo avance"
Na minha infância e adolescência aprendi que o verdadeiro heroísmo não estaria nos actos fantásticos de coragem que, muitas vezes, as circunstâncias, consciente ou inconscientemente, ditam, mas sim, no esforço continuado, anónimo do quotidiano, de cada segundo, para viver com dignidade, plenitude e em comunhão consigo próprio,o mundo e o outro.
Com estes ensinamentos nunca me senti inclinado para a adulação de fãs e mitos, mas sim, para um profundo respeito e amor por aquelas e aqueles que, no dia a dia, constroem um mundo melhor, e, eles próprios, se tornam melhores pessoas.
Também não concordo com Kant, quando diz que não faz sentido cantar os que se ultrapassam, porque só fizeram o que moralmente lhes era exigido, o que sendo certo, os distingue, por essa não ser a regra e ter para quem responde ao chamamento da sua consciência, da humanidade e, ou do mundo um preço muito alto que muitos recusam.
Todos os negros da África do Sul deviam ter sido Mandelas , mas muitos não o foram, por isto, é legitimo exaltar Mandela, até porque o seu heroísmo esteve na luta que durante 27 anos de cativeiro travou contra o apardheid.
Nesta linha de pensamento estamos hoje a ser interpelados para acompanharmos, apoiarmos, aprendermos muito sobre quem somos, enquanto pessoas individuais e enquanto humanidade com a experiência limite que os 33 mineiros soterrados no Chile, estão a viver.
Esta experiência interpela-nos quanto à capacidade individual e de grupo para se sobreviver física, psicológica e socialmente por um longo período, quando todas as circunstâncias de vida se alteram radicalmente, quando todos os hábitos de vida alimentares, rotinas etc mudam de um momento para outro. Fazer as novas adaptações é uma tarefa de uma dimensão inefável.
Mas também esta experiência vai interpelar -nos, quanto à capacidade de humanidade, do governo do Chile e de todos nós, para não abandonarmos estes homens nestes longos meses, em que nos vão ensinar a como resistir, e muito, muito mais, o que, todos, temos de aproveitar e, em particular, os técnicos médicos, psicólogos, da segurança e da selecção e formação dos mineiros e outros corpos profissionais.
Esta dramática experiência é, do ponto de vista psicológico, completamente diferente da dos astronautas, estes, foram preparados durante muito tampo, para participarem numa aventura de descoberta, gloriosa, o que, leva a uma vivência diferente dos riscos, mesmo, da perda da vida, enquanto estes mineiros estão a experenciarem uma vivência de desastre, pelo que, desde logo, é necessário mudar esta percepção.
Todavia de momento todos os conhecimento das experiências da NASA, de outros acidentes e das vivências no interior dos submarinos serão muito, muito importantes, mas, doravante , deveria fazer-se em todos os países com fortes tradições mineiras, um esforço concertado para evitar este acidentes, pensar melhor nas medidas de salvamento e também preparar física e psicologicamente estes profissionais e os seus familiares para estas experiências limite, o que, se nunca foi feito, deverá ser a partir de agora equacionado.
Neste quadro de heroísmo destes mineiros, é lamentável que por vaidade e quase sem respeito pelo significado do seu grande sacrifício, técnicos, nomeadamente psicólogos, sem qualquer conhecimento teórico e experiência de catástrofes deste teor debitem opiniões avulsas, quando o que está em causa é reconhecer que poucos ou nenhuns se preocupam com estes assuntos, embora tenham sempre uma urgência parola e desrespeitosa pelas vitimas para virem para as TV dizerem banalidades, quando naturalmente o que importaria era chamar a atenção que nos países com tradição mineira, tem de se avançar muito, nas disciplinas relacionadas com as catástrofes.
Para mim heróis são estes mineiros e todos os que lutam pela sua sobrevivência, mas também neste grupo dos meus heróis, únicos e verdadeiros, incluo as mulheres e os homens, jovens e outros, com salários em atraso, desempregados sem "cheta", sem certezas quanto ao seu Futuro, e que, continuam a ter esperança e a teimarem em viverem em harmonia, sem se suicidarem ou revoltarem.
Estas e estes também são os meus heróis, como o são ainda os que em condições muito difíceis, com perigo de perda da sua liberdade, da vida e de interesses materiais lutam nas ditaduras e nas semi-democracias pela justiça social. Vós todos sóis para mim os verdadeiros heróis, ao nível dos marinheiros dos descobrimentos.
Abraço-vos e choro com as vossas dores e angústias, porque vos amo. Uma LÁGRIMA é sempre um cristal de AMOR.
andrade da silva
10 comentários:
Condenação
Culpada pela voz
que tenho calada
sou o meu algoz
com alma gelada
No morto caminho
o vento farfalha
de grosseiro linho
é minha mortalha.
Cortaram a língua
silêncios de morte
a matar à míngua
meus versos chicote.
Se por mim passo
não me reconheço
no som que desfaço
que outro não mereço.
Segreda a noite
murmúrios das águas
aonde eu acoite
dó de minhas mágoas.
Vivo comigo
virada pra dentro
fechei o postigo
não há movimento.
A luz está cega
a água com sede
os meus olhos regam
apenas parede.
Na escuridão
eu sou assassina
pela minha mão
matei a menina.
Agora que o tempo
manda mais que eu
só a voz do vento
baixinho gemeu.
Nem frases nem gritos
nascidos na alma
estridentes apitos
sobre a minha calma.
Vou consentindo
calada em silêncio
neste e desmentido
do que sou ou penso.
Marília Gonçalves
Nesta dorida anemia
que é minha que me pertence
transfusões de poesia
vão alimentando vida
neste fogo que me aquece.
Os versos brotam espontâneos
desta escondida nascente
que há nós olhos do poeta
poisados em toda a gente.
Marília Gonçalves
Marilia
Um abraço que viva sempre a voz da poeta.
asilva
Grande lição de heroicidade . os mineiros do Chile nos deram ontem !
ao vê-los e ouvi-los cantar o hino do seu País fiquei com pena de não saber o seu hino para com eles cantar! chorei enquanto cantavam. no meu coração mora uma grande esperança que tudo vai correr bem. que linda prenda de natal seria para todos nós! O meu amor abraça-vos
Realmente, é algo já tido como natural, viver em situações-limite. È mau sinal, mas é a realidade. O que não é vulgar é a maneira como nos "entendemos" com esse "limite". E é aqui que uns são mais plásticos que outros, que uns conseguem ultrapassar esse limite e serem eles próprios o alvo para que todos olhamos, com respeito e consagração...e outros não.
Um minuto, também, por todos aqueles que, humanamente, não conseguiram derrotar a adversidade, mas nos mostraram que, algures, nos espreita a possibilidade de darmos de cara com essas situações em que o limite nos esmaga.
Agora
Ser humano meu irmão
à nossa porta igualmente
vem bater o coração
da vida de tanta gente.
Se na construção da vida
soubermos dar-nos as mãos
mesmo se dói a subida
seremos todos irmãos.
Mas se cada um optar
pla outra estrada velhinha
verá no tempo a passar
a vida morta, sozinha.
Por isso o tempo é de opção!
De escolha firme e urgente:
ou damos vida a um irmão
ou morremos igualmente.
Marília Gonçalves
Amigas
A dor, infelizmente pelo muito pouco amor que há pelo outro é muito abundante no Mundo. Estes 33 mineiros são uma pequena gota, hã tanta gente a sofrer por estar instalada em celas piores que aquela gruta só porque querem ser livres.
Hoje li um texto no jornal I impressionante, um jornalista que acompanhou um grupo de jovens comunistas identificou que perante tanta ausência de bondade, falar dela, seria tão absctrato e religioso como falar de Deus, e que deste ponto de vista aqueles jovens comunistas e outros que acretidam nestas coisas seriam os últimos religiosos e ingénuos das sociedades de hoje, Ele terá razão? Inquietante!
abraços
asilva
o Germinal ao vivo
o horror como paga da realidade e do esforço do trabalho!
Amargo pão!
e na mesa do patrão as luzes e o excesso!
Marília Gonçalves
« Preguntitas sobre Dios », Atahualpa Yupanqui
« Petites questions sur Dieu »
Un dia yo pregunté / Un jour moi j’ai demandé :
Abuelo, donde está Dios ? / Grand-père, où se trouve Dieu ?
Mi abuelo se puso triste / Grand-père triste est devenu
y nada me respondió. / et ne m’a rien répondu.
Mi abuelo murio en los campos / Il est mort dans les champs, un jour,
sin rezo ni confesión. / sans prières ni confessions.
Y lo enterraron los indios / Et les indiens l’ont enterré,
flauta de caña y tambor. / flûte de roseau et tambour.
Al tiempo yo pregunté / Un peu plus tard j’ai demandé :
Padre, que sabes de Dios ? / Père, que sais-tu de Dieu ?
Mi padre se puso serio / Mon père grave est devenu
y nada me respondió. / et ne m’a rien répondu.
Mi padre murio en la mina / Mon père est mort dans la mine
sin doctor ni protección. / sans docteur ni protection.
Color de sangre minera / Couleur du sang des mineurs
tiene el oro del patrón. / que celle de l’or du patron.
Mi hermano vive en los montes / Mon frère qui vit dans la forêt
y no conoce una flor. / ne connaît pas la moindre fleur.
Sudor, malaria, serpientes, / Malaria, serpents et sueur,
es la vida del leniador. / telle est la vie du bûcheron.
Y que nadie le pregunte / Et n’allez pas lui demander
si sabe donde está Dios. / s’il sait où se trouve Dieu.
Por su casa no ha pasado / Chez lui n’est jamais passé
tan importante señor. / un aussi important Monsieur.
Yo canto por los caminos, / Moi je chante par les chemins
y cuando estoy en prisión / et quand je suis en prison
oigo las voces del pueblo / du peuple j’entends les voix :
que canta mejor que yo. / il chante beaucoup mieux que moi.
Hay un asunto en la tierra / Il est une affaire sur terre
mas importante que Dios. / plus importante que Dieu.
Y es que nadie escupa sangre / Que personne ne crache le sang
para que otro viva mejor. / pour que d’autres vivent mieux.
Que Dios vela por los pobres ? / Dieu veille-t-il sur les pauvres ?
Tal vez si, y tal vez no. / Peut-être que oui, peut-être que non.
Pero es seguro que almuerza / Mais il est sûr qu’il déjeune
en la mesa del patron. / à la table du patron.
à écouter chantée par le poète argentin Atahualpa Yupanqui :
http://blog.argentine-news.com/?p=967
impression Imprimer cet article
Enviar um comentário