Último Abismo
Que voz é esta que o silêncio habita
que nos sufoca, nos prende a vontade
que vozes soam na nossa alma aflita
entre o segundo e a eternidade?
À beira do abismo impenetrável
quando se cala o brilho dum olhar
cambaleantes sobre o insondável
nós olhamos, olhamos, sem conseguir pensar.
Em nosso semblante a transparência finda
a cor da parca imunda penetra-nos a face
ou é o silêncio que nos habita ainda...
E nenhum grito há que nos liberte
nem palavras nem prantos nem sorrisos
ante a verdade gélida e inerte.
Marília Gonçalves
(este poema foi escrito aquando da morte de meu pai, nesses terríveis dias que seguiram, eu mesma, branca como morta, tinha dificuldade em perceber a realidade do ocorrido, agora que passaram quase 27 anos, a saudade imensa continua presente, mas o tempo ajudou-me a transformar a dor numa ternura infinita e num eterno respeito))
Que voz é esta que o silêncio habita
que nos sufoca, nos prende a vontade
que vozes soam na nossa alma aflita
entre o segundo e a eternidade?
À beira do abismo impenetrável
quando se cala o brilho dum olhar
cambaleantes sobre o insondável
nós olhamos, olhamos, sem conseguir pensar.
Em nosso semblante a transparência finda
a cor da parca imunda penetra-nos a face
ou é o silêncio que nos habita ainda...
E nenhum grito há que nos liberte
nem palavras nem prantos nem sorrisos
ante a verdade gélida e inerte.
Marília Gonçalves
4 comentários:
O Relógio da Torre
Para quê saber o fundo da angústia
esse uivo vendaval que cedo surpreende
para quê conhecer a hora da argúcia
quando voam gaivotas sobre corpo de sede.
Remoinhos nos olhos levantam pensamento
onde folhas de outono poisaram tristemente
o cofre das lembranças e o do sentimento
deixam voar saudades a desfazer-se sempre.
Só uma badalada no pêndulo da torre
por uma hora magra, breve que nos resta
enquanto sobre nós cada dia que morre
na espessura da noite vai cobrir a floresta.
O cantar da sereia veio do tempo de Ulisses
ou navio que se afasta na estridência do cais
a navegar a bruma duma ilha de Circe
no rouco som que parte para não voltar mais.
Perfume de Agosto sobe do fim do tempo
com risos a cantar e manhãs a nascer
mas são vozes do cofre que estão em movimento
ou retratos antigos a chegar pra nos ver.
Tudo quanto nos cerca tem o tom conhecido
da constante paisagem do que somos na vida
como oferenda eterna do eco pressentido
no timbre cor de mel que nos serena ainda.
Minutos de surpresa e continua a espera
vertigem de viagem no encontro dos dias
mesmo se o mês de Outubro nos cheira a primavera
vão pairando no ar as velhas sinfonias.
A mão que nos segura, vacilando fraqueja,
tempo tem limite, tem portas e fronteiras
instante sereno que nosso alento beija
vai desfolhar a flor de nossas sementeiras.
Somos ainda sol amarelo de verão
uma praia aquecida no acaso da tarde
uma palavra solta na voz duma canção
uma fímbria de luz na breve imensidade.
Uma certeza só, perdida, inviolável
que nada trairá nem poderá vencer
encontro perene, olhar inevitável
vestido de distância, mas que nos faz doer.
solitário apito, um chamamento apenas
acena-nos de leve a esperada viagem
e nossas pobres forças, humanas, tão pequenas
vão subir o degrau da última coragem.
Marília Gonçalves
(este poema obteve o 1° prémio de Poesia no Concurso "DAR VOZ à POESIA organizado em Ovar pela Dr Ilda Regalado)
um abraço de solidariedade querido capitão de abril, nesta hora dolorosa.
Marilia e companheira/o anonimo
Abraço
asilva
Rêves d'Automne de Lamartine
Salut ! bois couronnés d'un reste de verdure !
Feuillages jaunissants sur les gazons épars !
Salut, derniers beaux jours ! le deuil de la nature
Convient à la douleur et plaît à mes regards !
Je suis d'un pas rêveur le sentier solitaire,
J'aime à revoir encore, pour la dernière fois,
Ce soleil pâlissant, dont la faible lumière
Perce à peine à mes pieds l'obscurité des bois !
Oui, dans ces jours d'automne où la nature expire,
A ses regards voilés, je trouve plus d'attraits,
C'est l'adieu d'un ami, c'est le dernier sourire
Des lèvres que la mort va fermer pour jamais !
Ainsi, prêt à quitter l'horizon de la vie,
Pleurant de mes longs jours l'espoir évanoui
Je me retourne encore et d'un regard d'envie
Je contemple ses biens dont je n'ai pas joui !
Peut-être l'avenir me gardait-il encore
Un retour de bonheur dont l'espoir est perdu ?
Peut-être dans la foule, une âme que j'ignore
Aurait compris mon âme et m'aurait répondu ? ...
La fleur tombe en livrant ses parfums au zéphyr ;
A la vie, au soleil, ce sont là mes adieux ;
Moi, je meurs et mon âme au moment qu'elle expire,
S'exhale comme un son triste et mélodieux.
Alphonse de Lamartine
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