quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Ao Nosso Estimado Capitão de Abril Andrade e Silva na despedida de sua Querida e Valorosa Mãe


Último Abismo

Que voz é esta que o silêncio habita

que nos sufoca, nos prende a vontade

que vozes soam na nossa alma aflita

entre o segundo e a eternidade?



À beira do abismo impenetrável

quando se cala o brilho dum olhar

cambaleantes sobre o insondável

nós olhamos, olhamos, sem conseguir pensar.



Em nosso semblante a transparência finda

a cor da parca imunda penetra-nos a face

ou é o silêncio que nos habita ainda...



E nenhum grito há que nos liberte

nem palavras nem prantos nem sorrisos

ante a verdade gélida e inerte.


Marília Gonçalves


(este poema foi escrito aquando da morte de meu pai, nesses terríveis dias que seguiram, eu mesma, branca como morta, tinha dificuldade em perceber a realidade do ocorrido, agora que passaram quase 27 anos, a saudade imensa continua presente, mas o tempo ajudou-me a transformar a dor numa ternura infinita e num eterno respeito))

4 comentários:

Marília Gonçalves disse...

O Relógio da Torre



Para quê saber o fundo da angústia

esse uivo vendaval que cedo surpreende

para quê conhecer a hora da argúcia

quando voam gaivotas sobre corpo de sede.



Remoinhos nos olhos levantam pensamento

onde folhas de outono poisaram tristemente

o cofre das lembranças e o do sentimento

deixam voar saudades a desfazer-se sempre.



Só uma badalada no pêndulo da torre

por uma hora magra, breve que nos resta

enquanto sobre nós cada dia que morre

na espessura da noite vai cobrir a floresta.



O cantar da sereia veio do tempo de Ulisses

ou navio que se afasta na estridência do cais

a navegar a bruma duma ilha de Circe

no rouco som que parte para não voltar mais.



Perfume de Agosto sobe do fim do tempo

com risos a cantar e manhãs a nascer

mas são vozes do cofre que estão em movimento

ou retratos antigos a chegar pra nos ver.



Tudo quanto nos cerca tem o tom conhecido

da constante paisagem do que somos na vida

como oferenda eterna do eco pressentido

no timbre cor de mel que nos serena ainda.



Minutos de surpresa e continua a espera

vertigem de viagem no encontro dos dias

mesmo se o mês de Outubro nos cheira a primavera

vão pairando no ar as velhas sinfonias.



A mão que nos segura, vacilando fraqueja,

tempo tem limite, tem portas e fronteiras

instante sereno que nosso alento beija

vai desfolhar a flor de nossas sementeiras.



Somos ainda sol amarelo de verão

uma praia aquecida no acaso da tarde

uma palavra solta na voz duma canção

uma fímbria de luz na breve imensidade.



Uma certeza só, perdida, inviolável

que nada trairá nem poderá vencer

encontro perene, olhar inevitável

vestido de distância, mas que nos faz doer.


solitário apito, um chamamento apenas

acena-nos de leve a esperada viagem

e nossas pobres forças, humanas, tão pequenas

vão subir o degrau da última coragem.



Marília Gonçalves

(este poema obteve o 1° prémio de Poesia no Concurso "DAR VOZ à POESIA organizado em Ovar pela Dr Ilda Regalado)

Anónimo disse...

um abraço de solidariedade querido capitão de abril, nesta hora dolorosa.

andrade da silva disse...

Marilia e companheira/o anonimo

Abraço
asilva

Marília Gonçalves disse...

Rêves d'Automne de Lamartine


Salut ! bois couronnés d'un reste de verdure !
Feuillages jaunissants sur les gazons épars !
Salut, derniers beaux jours ! le deuil de la nature
Convient à la douleur et plaît à mes regards !

Je suis d'un pas rêveur le sentier solitaire,
J'aime à revoir encore, pour la dernière fois,
Ce soleil pâlissant, dont la faible lumière
Perce à peine à mes pieds l'obscurité des bois !

Oui, dans ces jours d'automne où la nature expire,
A ses regards voilés, je trouve plus d'attraits,
C'est l'adieu d'un ami, c'est le dernier sourire
Des lèvres que la mort va fermer pour jamais !

Ainsi, prêt à quitter l'horizon de la vie,
Pleurant de mes longs jours l'espoir évanoui
Je me retourne encore et d'un regard d'envie
Je contemple ses biens dont je n'ai pas joui !

Peut-être l'avenir me gardait-il encore
Un retour de bonheur dont l'espoir est perdu ?
Peut-être dans la foule, une âme que j'ignore
Aurait compris mon âme et m'aurait répondu ? ...

La fleur tombe en livrant ses parfums au zéphyr ;
A la vie, au soleil, ce sont là mes adieux ;
Moi, je meurs et mon âme au moment qu'elle expire,
S'exhale comme un son triste et mélodieux.

Alphonse de Lamartine