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"Poema à mãe" Eugénio de AndradeNo mais fundo de ti,eu sei que traí, mãe!Tudo porque já não souo retrato adormecidono fundo dos teus olhos!Tudo porque tu ignorasque há leitos onde o frio não se demorae noites rumorosas de águas matinais!Por isso, às vezes, as palavras que te digosão duras, mãe,e o nosso amor é infeliz.Tudo porque perdi as rosas brancasque apertava junto ao coraçãono retrato da moldura!Se soubesses como ainda amo as rosas,talvez não enchesses as horas de pesadelos...Mas tu esqueceste muita coisa!Esqueceste que as minhas pernas cresceram,que todo o meu corpo cresceu,e até o meu coraçãoficou enorme, mãe!Olha - queres ouvir-me? -,às vezes ainda sou o meninoque adormeceu nos teus olhos;ainda aperto contra o coraçãorosas tão brancascomo as que tens na moldura;ainda oiço a tua voz:"Era uma vez uma princesano meio de um laranjal..."Mas - tu sabes! - a noite é enormee todo o meu corpo cresceu...Eu saí da moldura,dei às aves os meus olhos a beber.Não me esqueci de nada, mãe.Guardo a tua voz dentro de mim.E deixo-te as rosas...
SÓ POR ISSO, MÃEMesmo que a noite esteja escura,Ou por isso,Quero acender a minha estrela.Mesmo que o mar esteja morto,Ou por isso,Quero enfunar a minha vela.Mesmo que a vida esteja nua,Ou por isso,Quero vestir-lhe o meu poema.Só porque tu existes,Vale a pena!Lopes Morgado
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2 comentários:
"Poema à mãe" Eugénio de Andrade
No mais fundo de ti,
eu sei que traí, mãe!
Tudo porque já não sou
o retrato adormecido
no fundo dos teus olhos!
Tudo porque tu ignoras
que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais!
Por isso, às vezes, as palavras que te digo
são duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.
Tudo porque perdi as rosas brancas
que apertava junto ao coração
no retrato da moldura!
Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos...
Mas tu esqueceste muita coisa!
Esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração
ficou enorme, mãe!
Olha - queres ouvir-me? -,
às vezes ainda sou o menino
que adormeceu nos teus olhos;
ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas
como as que tens na moldura;
ainda oiço a tua voz:
"Era uma vez uma princesa
no meio de um laranjal..."
Mas - tu sabes! - a noite é enorme
e todo o meu corpo cresceu...
Eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber.
Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas...
SÓ POR ISSO, MÃE
Mesmo que a noite esteja escura,
Ou por isso,
Quero acender a minha estrela.
Mesmo que o mar esteja morto,
Ou por isso,
Quero enfunar a minha vela.
Mesmo que a vida esteja nua,
Ou por isso,
Quero vestir-lhe o meu poema.
Só porque tu existes,
Vale a pena!
Lopes Morgado
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