sexta-feira, 5 de dezembro de 2008


Avenida



Fui ainda há pouco a Lisboa
pensando matar saudades
a vida não se fez boa
a quem fugiu prás cidades
As saudades não se matam
porque logo nascem mais
mas as vozes nos desatam
e fazem de nós pardais
Estou na Baixa, e os meus olhos
não vêem prédios nem chão
só vêm dor, mar d'escolhos
a esbarrar na multidão
Lá anda gente a correr
pela vida aos tropeções
lá estão outros a vender
miséria em sonho aos milhões
O pobre pé, descalçado
não incomoda ninguém
tão visto já, resfriado
e nascido de uma mãe !!!
Não me quero ir já embora
tenho ainda muito que ver
mesmo que me doa agora
eu não me quero esquecer
Que se nascemos com olhos
é para ver as montanhas
de injustiças e de abrolhos
que ao homem rasga as entranhas
Lá vai o miúdo roto
leva as mãos nas algibeiras
com ar gaiato e maroto
dizendo duas asneiras
Mas dentro, lá bem no fundo
andam versos a nascer
e é por ser filho do mundo
que anda por aí a sofrer
Que essas palavras que larga
a desafiar a populaça
são feitas da dor amarga
que mesmo pequeno passa
E agora aqui ao lado
esta um ceguinho a tocar
a pensar também que é fado
andar com fome a cantar
agora... aqui vou eu....
aqui está Martim Moniz
quanta gente a quem mordeu
outra rica, má feliz!
e os meus passos no dia
feito da noite brutal
vão comendo poesia
no homem que vive mal
Enquanto sigo dorida
a olhar o temporal
vou subindo a Avenida
mas firme, no vendaval!!
Já cheguei ao Intendente
e por entre a gente séria
quanta infeliz que mal sente
que não tem mais que miséria
Ai ó senhoras honradas
que me apetece insultar
as vidas despedaçadas
nascem do vosso luxar
Ás que vivem sem sentir
as que choram como nós!
se passarem a sorrir
as mais perdidas sois vós!!
Porque quem vive diferente
se a porta não viu fechada
prá vida passar decente
não lhe custou mesmo nada!
São filhas da noite escura
dum estado podre de velho
e esta ferida que ainda dura
é o seu mais fiel espelho
Mais uns passos, finalmente
eis chego à Praça do Chile
ó povo depressa ó gente
façamos mais um Abril!!!

Marília Gonçalves


4 comentários:

andrade da silva disse...

Marilia
Como conheço esta Lisboa!

Que maravilhosa crónica desta Lisboa que já foi a capital da LIBERDADE e Foi PALCO do 25 de Abril, com o Povo e o Salgueiro Maia em Lisboa, mas do outro lado a Escola Prática de Artilharia e o Povo do Pragal em peso, do Cristo Rei estavam atentos, e prontos a não perderem a Revolução.

Esta Lisboa é hoje um dos grandes teatros da Europa de um dos ensaios mais perigosos, de como docemente de eleição, em eleição, se institucionaliza um regime contra a esperança, a solidariedade, a liberdade e a justiça social.

Marilia

Abril morre.

Abraço
Asilva

Marília Gonçalves disse...

Companheiro de Abril



Não!

Podem tentar assassinar Abril, mas enquanto nas artérias de Lisboa, nas entranhas de Portugal houver uma pérola de sangue de um CRAVO VERMELHO dessa Aurora Luminosa que foi o amanhecer da Liberdade, o despertar da Esperança, o abrir de portas insuspeitas até esse dia aos direitos legítimos e justos, à construção de novas mentalidades, a nossa memória de POVO que ama e respeita Portugal, os que por valores têm o Amor à Terra que é simultaneamente mãe e pai, Abril nunca morrerà, ou terão que matar-nos, portugueses com Portugal de Abril também!

Abril não morre, porque o Futuro, porque a Juventude precisa de Abril, mesmo que tenha que aprender a soletrar valores esquecidos, realidades deturpadas, enquanto os tentam convencer num país cada vez mais pobre que cada um pode enriquecer, quando é sabido que são precisos pobres explorados para fazer um rico!

Não meninos! Não vão enriquecer! Como vossos pais não enriqueceram! A vossa única riqueza é a clarividência do pensar, é a vossa inteligência para apreender as lições da história para que nao se repitam nunca. E o vosso firme e magnífico não, perante o papel que vos tentam fazer representar! E o caminho do Pensar a construir!

VAMOS A ERGUER A VOZ

Vamos reaprender ABRIL? A única época em que a nossa vida se encontrava nas nossas mãos e nos nossos cérebros de Seres pensantes!

Abril não morre!!!

Abril vai RENASCER!

em FRENTE GENTES

ADIANTE COMPANHEIROS!

Marília Gonçalves

andrade da silva disse...

MARILIA

Compreendo a força das suas palavras e os eus sentimentos de que partilho e luto desde sempre por Abril, nunca, nunca o traí.

Sei que muitos lutarão e estão a lutar por Abril que resiste às punhaladas mil que desde o 25 de Novembro de 1975 lhe têm cravado, o que logo foi feito nesse dia com a ignominiosa traição, concebida e planeada pelos américas, os alemães e o fascista do Franco e executada por muitos que andam por aí de cravo ao peito calados que nem ratos e pondo bombas de silêncio, onde, se fala e luta por Abril.

Todavia apesar da corrupção, das medidas graves contra as pessoas e a vergonhosa protecção dos ricos, dizem as sondagens que os cidadãos eleitores querem confiar um novo mandato ao actual 1º Ministro para legitimado pelo voto continuar esta politica de defesa dos interesses do grande capital. È neste sentido que Abril morre assassinado por sucessivos actos eleitorais que não tiram o país do jugo da direita e do neo-liberalismo. Não é por acaso que o sr.Isaltino de morais diz que o Sr. eng Sócrates tem um perfil ideal para líder do PSD.

Mas sobre esta estratégia do PS para a conquista da maioria vou colocar um post.
obrigado
abraço
asilva

Jerónimo Sardinha disse...

Cara Marília,

De Abril, vai restando uma saudade, acompanhada de dor e pouco mais, em muitos dos que o quiseram puro e diferente.

Se é certo que os que se alcandoraram a dirigentes, ou ditos, são responsáveis por todos os desvios e oportunismos, não será menos verdade a culpa, inteira, deste povo abastardado.

Até estamos numa época, boa por excelência, para avaliar essa torpeza.

Da pobre Lisboa que viu nascer Abril, pouco resta. E esse pouco, vai sendo cada vez mais descaracterizado, vendido a interesses pessoais e oportunismos capitalistas.
Basta-nos como "pequeno" exemplo a agora propalada muralha de contentores de Alcântara. Basta ver quem está envolvido, o que fez no passado, quem era no "tal dia" e o que é hoje.

Mas lutar por ABRIL é uma obrigação e um dever de todos os que acreditam na LIBERDADE e na CIDADANIA.

Abraço fraterno e obrigado pelos seus emotivos recortes.

Jerónimo Sardinha