quarta-feira, 20 de abril de 2011

Capitão de Abril recorda momentos marcantes



“Dignificação, Democracia E Desenvolvimento”

18 de Abril de 2011 especial  25 de Abril Tribuna de Loures

Capitão de Abril recorda momentos marcantes
“Dignificação, Democracia E Desenvolvimento”

João Andrade e Silva, era um jovem militar que teve um papel fundamental na Escola Prática de Artilharia. A Tribuna quis saber a sua história e o seu olhar sobre a revolução
que viria a mudar o destino de Portugal.


Em Novembro de 1972 Andrade da Silva era Alferes, tinha 24 anos de idade, cumpria serviço militar em Damba, Angola, mas, por essa altura já se sentia à “beira do colapso”, pois não concordava com uma guerra “ sem história e sem futuro”, nem com a ditadura em que vivia o país.

Regressado a Portugal, em 1973 participa activamente no movimento de capitães, movimenta-se entre as forças que pretendiam a queda do fascismo em Portugal.

Com apenas 25 anos, este militar sabia quais os seus ideais para o futuro e reunia-se com outros militares para planearem não o que seria a “revolução dos cravos”, mas a derrota do regime e a saída de Marcelo Caetano da frente do país.

No 25 de Abril 1974, “tomo parte no Movimento das Forças
Armadas, desde logo, às 22 e 55 minutos do dia 24, aos
primeiros acordes da canção “Depois do Adeus”, de Paulo
de Carvalho, chefio a equipa que assaltou o gabinete do
comandante para o deter e tomar a unidade, acção feita ao
segundo, sem nenhuma hesitação, apesar de um dos meus
camaradas, o, supostamente, mais operacional, não se ter
apresentado na hora e no local certo”, salienta.

Fizeram parte desta equipa de assalto, os tenentes Henrique
Pedro e tenente Sales Grade, este, em substituição, do tenente Amílcar Rodrigues.

“No quarto do tenente Sales Grade o que se fazia, desde
sempre, era a escuta da rádio BBC e naquela noite dos
emissores que iam difundir a 1ª senha”, recorda Andrade
da Silva. Depois de tomado o gabinete do comandante, coube ao capitão Patrício relatar o que se estava a passar e ordenar a detenção dos comandantes e de todos aqueles que não se
associassem à revolução.

O silêncio e o frio da liberdade

Partem de madrugada com destino a Lisboa. A saída da unidade
traz-lhes a missão de ocupar posições junto ao Cristo-Rei, em
Almada de forma a bater em tiro directo qualquer coluna que
atravessasse a ponte ou qualquer navio no estuário do Tejo
que estivesse a favor do regime. Tinham objectivos de tomar
em Lisboa, o Terreiro do Paço e Monsanto, bem como montar
segurança externa à unidade e controlo de vias de comunicação.
Para Andrade e Silva esta foi a viagem mais fria da sua vida “senti muito frio e o silêncio da noite tornava-se assustador,
quando aliado à falta de notícias do desenrolar dos acontecimentos”.

Recorda-se de chegar ao Pragal pela manhã quando as pessoas estavam a sair de casa para o trabalho, cansados, ansiosos e
com fome, “as pessoas não olhavam para nós era estranho, nós estávamos a fazer uma revolução por nós, pelo povo pela
Liberdade e as pessoas não levantavam o olhar do chão. Foi uma sensação estranha, que recordo até hoje”.

Depois dos acontecimentos e da libertação dos presos políticos, depois da “missão cumprida” era hora de regressar a casa,
Vendas Novas. O capitão de Abril, rasga então um sorriso, “foi um momento espectacular, pois as pessoas rendiam-se à nossa passagem na estrada e agradeciam sem descanso a retoma da Liberdade, da sua dignidade e esse momento não se esquece,
guarda-se no arquivo onde faltam as fotografias”,recorda.

Chegados a Vendas Novas o povo saiu à rua e foi momento de
partilha e de festa, foi hora de dar aos pobres a forma de sustentar as suas famílias e de dar a cada cidadão a sua dignidade como
ser humano, “eu vinha de famílias pobres e entendia as dificuldades
das famílias empobrecidas pelo regime. Era hora de tirar aos grandes senhores das terras e repartir pelos pobres”, ressalva o
capitão de Abril.

37 anos depois da revolução dos cravos

Andrade da Silva diz estar “muito desencantado” com a actual
conjuntura política do país, coronel do Exército na reserva, um
dos responsáveis pela reforma agrária, não vê de forma positiva
a crise que o país atravessa, “A democracia não é compatível
com a actual situação. Ou se resolve a crise, ou vem tempos
complicados. Batemos no fundo agora há que submergir, alterar
pensamentos e desenvolver estratégias.”

Este deve ser “um momento para reflectir”, porque este “é um
problema para amanhã. A crise é um acto político, um acto de
governação falhado”, salienta.

Andrade da Silva identifica ainda outra situação, “há muita gente
a fazer diagnósticos, mas ninguém apresenta propostas novas,
não avançam. Nisto o Presidente da República e o Primeiro-
-Ministro têm razão. O país precisa de deputados mais
autónomos que possam fiscalizar a acção governativa e que
não sejam meros veículos de transmissão partidária mas tenham
compromissos”, defende.

37 anos após o 25 de Abril “esse momento histórico que muitos
contam euforicamente, está aqui. Mas há o falhanço da política,
os ricos cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres,
uma sociedade cada vez mais injusta, a perda de direitos
alcançados com anos de luta”.

Recorda a revolução como “algo excepcional, provavelmente
irrepetível”. Hoje vivemos momentos tristes sem esperança. Há
uma multidão de polidores de esquinas, de homens encostados
para aí. Em 1974, tínhamos um país diferente com pobreza
mas com alegria. Hoje é um país pobre, não do ponto de vista
económico, mas sobretudo cultural, moral, republicano e civilizacional”, recorda, Andrade da Silva.

Texto  Fátima Rodrigues

3 comentários:

andrade da silva disse...

Obrigado Marília

Este texto é uma grande síntese de uma longa e apaixonante conversa. Todavia quanto ao vir de famílias pobres exige um esclarecimento sou filho de um capitão do Exército que morreu em 1963, a partir daí, para mim, o tenebroso regime fascista que foi bondoso para os corruptos e poderosos de sempre dava a cada um dos filhos uma pensão de 100 escudos, com o desconto de um escudo como imposto de selo, e, por isto, tudo, da minha parte fica contado acerca desse regime.

Nesta conjuntura a minha mãe emergiu, como uma mãe- coragem uma Heroína.

Quanto à autonomia dos deputados é uma necessidade vital para a democracia, mas nada se vai alterar e o Inferno vai ser o destino, porque os cúmplices, os conservadores do pântano dominam todo o palco e vão abrir caminho ao Homem providencial que provavelmente vai emergir, dentro de um , dois anos, como o salvador, pela mãos do PR, o Sr. Rui Rio.

asilva

Marília Gonçalves disse...

ai, Companheiro, a vida do povo português, que vivia de trabalhar, foi e infelizmente continua a ser um mar de aflição, quando surge uma morte ou uma doença nas famílias
o seu caso, doloroso é testemunha de uma época de que poucos testemunham em voz alta, o que é pena
eu, da minha história contei também os trabalhos em que me vi, menina ainda e que condicionaram toda a minha vida, por nunca ter tido apoio, donde quer que viesse. Se todos viessem testemunhar, talvez se fechasse a porta a falsos messias e hipócritas oportunistas. Era tempo de as vítimas compreenderem que o são e denunciarem os culpados de seus sofrimentos e as artimanhas que usam, para convencer incautos e ingénuos.
A cada um com consciência, que veja o valor do contributo cívico que é o seu testemunho
abraço para si
sua amiga
Marília Gonçalves

andrade da silva disse...

Marília

Humberto Delgado dizia que éramos um país de escravos, eu digo de cangados muitos, de cobardes bastantes que só quando têm as costas quentes falam contra os poderosos, de resto

Salazar era um inimigo feroz do povo português, queria-nos todos a pão e água e com sapatos rotos, à sua imagem e semelhança, porque o Sr. era um tirano e um asceta patológico, que como acontece, como sintoma no caso da esquizofrenia, parece que se julgava mandatado por Deus para pelo caminho do suplicio e do silício nos levar para o Céu, de acordo com a visão beata e da Idade Média do que era a salvação.

Somos um país quase paralisado pelo medo de desagradar ao cardeal da respectiva capela.

abraço
asilva