quinta-feira, 5 de julho de 2012

A VISÃO DE UM CIDADÃO COMUM XXIII ( Um passo em frente … )






Na passada sexta-feira em pleno rescaldo da última reunião do Eurogrupo, a União e os “mercados” respiraram de alívio... A política de austeridade de frau Merkel tinha sido derrotada pela inesperada rebelião de Mario Monti e Mariano Rajoy que unidos conseguiram que a chanceler alemã fosse obrigada a ceder em dois pontos: o Mecanismo Europeu de Estabilização (MEE), ou seja, o fundo de resgate europeu permanente que será utilizado em breve vai poder entregar dinheiro diretamente aos bancos espanhóis e comprar a dívida italiana sem exigir um programa de rigor como aquele que foi imposto aos países já resgatados (leia-se sequestrados) a nível financeiro.

O resultado da cimeira também obrigou a frau Merkel a comparecer na sexta-feira à tarde no Parlamento alemão, onde teve que se comprometer (e a Alemanha por arrasto) a defender um programa de crescimento e emprego e um imposto sobre transacções financeiras para conseguir a maioria de dois terços necessária para aprovar o Tratado Orçamental Europeu e o Mecanismo Europeu de Estabilidade.

Esta aparente inversão da politica Europeia foi extremamente bem recebida pelos ditos “mercados” no que se traduziu numa imediata valorização do Euro face ao seu rival Dólar, diminuição das taxas de juro aplicadas às dívidas soberanas europeias e valorizações dos índices e títulos transacionados em bolsa...ou resumindo aquilo a que hoje se apelida de “alivio dos mercados”.

Mas haverá realmente um motivo concreto para festejos? Já se vislumbra uma “luz” ao fundo do túnel? Honestamente, creio que a resposta será negativa para ambas as questões levantadas senão vejamos:

Nesta cimeira não foram aprovadas nem tão pouco formuladas quaisquer propostas que se traduzam em medidas concretas que resolvam os problemas estruturais da Europa, principalmente das economias mais fragilizadas como a Portuguesa.

O que pareceu aos olhos da opinião pública uma vitória dos países do sul face à hegemonia Alemã não passou de uma jogada desesperada de Monti e Rajoy para evitar uma humilhação para as nações que representam e que teria graves consequências para a sua política interna.

Uma maior degradação da dívida pública empurraria o Governo de Mario Monti para um amargo fracasso – aliás na cimeira de Bruxelas, o primeiro-ministro italiano chegou a ameaçar demitir-se – e para a convocação de eleições antecipadas no outono. O momento em Itália é extremamente delicado, apesar da eficaz encenação montada pelo executivo tecnocrata de Monti. O sistema político encontra-se em fase de desintegração: o centro direita precisa de se reabilitar, depois do desastre de Berlusconi; o centro esquerda (Partido Democrático) vai à frente nas sondagens, mas falta-lhe coerência e fôlego; o movimento antipolítico chamado Cinque Stelle, anda à volta dos 20%, em algumas sondagens; Berlusconi – muito motivado por este último – volta à ribalta arvorando a bandeira do regresso à lira.

O caso espanhol apresenta contornos mais definidos: os problemas de capitalização da banca espanhola. A suspeita generalizada de que os problemas de Espanha são muito maiores do que admitem os governos que se sucederam no poder, nos últimos sete meses. Uma suspeita bem arreigada em determinados círculos da City de Londres. Ao contrário de Itália, a Espanha não tem problemas de estabilidade parlamentar. O Governo dispõe de uma maioria absoluta de 186 deputados e quase quatro anos pela frente.

Rajoy não sofre da precariedade de Monti, mas uma intervenção formal da economia nos moldes aplicados pela Troika à Grécia, Irlanda e Portugal poderia sujeitá-lo a uma fortíssima erosão e a elevadas tensões sociais

O Bundesnachrichtendienst, os serviços de informação alemães, controlados diretamente pelo Gabinete da chanceler, terão informado pormenorizadamente Angela Merkel dos potenciais riscos de um descontrolo político em Itália e Espanha, que poderiam constituir a origem de uma possível desintegração do euro com custos incalculáveis para a Alemanha e terá sido este estudo a
principal razão para uma capitulação temporária do executivo germânico na última cimeira.

No entanto, a Alemanha jogou uma jogada de mestre que terá passado despercebida à maioria dos observadores:

A troco de algumas cedências - nomeadamente a possibilidade de compras de dívida pública por parte dos fundos de resgate (FEEF/MEE) ou a de os fundos europeus recapitalizarem directamente bancos - ganha tempo que precisa para se organizar e consegue que os países da zona euro abdiquem da sua Soberania ao admitirem que o Banco Central Europeu possa assumir as competências de supervisão e controlo sobre todo o sistema bancário da União. Supervisão e controlo, a partir de Frankfurt, de todo o sistema bancário europeu (excluindo o Reino Unido, evidentemente). Bem como abrirem as portas para a federalização da União Europeia através do Tratado Orçamental Europeu, que no seu extremo prevê que os Orçamentos de Estado tenham de ser previamente aprovados por Bruxelas.

Como poderão constatar não existem motivos de júbilo, se estávamos à beira do abismo acabámos de dar um passo em frente, resta saber se ainda estaremos a tempo de dar um ou mais para trás...

Um abraço,
Nuno Melo
03 de Julho de 2012

1 comentário:

andrade da silva disse...

Mas apesar de algum optimismo da tua parte,parece que parte dessas boas medidas já estão a ser postas em causa por outros países europeus,como a Finlândia, embora pareça que a Alemanha terá cedido algo.
Mas o problema de fundo não se está a resolver, e depois terá de se medir a relação beneficio, custo de soberania, o que no caso português parece ser gritante o desfasamento entre custo e beneficio, e mesmo que venha a haver o alargamento do prazo para o reajustamento sem a activação da economia e politicas justas de redistribuição da riqueza e da solidariedade europeia ( mutualização da dividas soberanas ) e transferências de fundos países mais ricos para os periféricos tudo é negro, com a agravante que em muitos países em vez de governos nacionais, há comissários dos interesses privados nacionais e internacionais.

Todavia por convicção ou encenação a sra. Merkel já vai percebendo que a derrota de qualquer país europeu afectará negativamente a Alemanha, mas estranhamente o FMI, parece querer endurecer as suas posições.

Seja como for ou os juros da dívida baixam significativamente ou nunca haverá hipóteses de acertar as conta, porque a despesa subirá exponencialmente, por causa dos serviços da divida, a recessão e o desemprego.
abraço
asilva