quinta-feira, 28 de maio de 2009

POESIA DA RESISTÊNCIA




POESIA DA RESISTÊNCIA – Romance do Homem da Boca Fechada

Jaime Cortesão – Romance do Homem da Boca Fechada

- Quem é esse homem sombrio
Duro rosto, claro olhar,
Que cerra os dentes e a boca
Como quem não quer falar?
– Esse é o Jaime Rebelo,
Pescador, homem do mar,
Se quisesse abrir a boca,
Tinha muito que contar.

Ora ouvireis, camaradas,
Uma história de pasmar.

Passava já de ano e dia
E outro vinha de passar,
E o Rebelo não cansava
De dar guerra ao Salazar.
De dia tinha o mar alto,
De noite, luta bravia,
Pois só ama a Liberdade,
Quem dá guerra à tirania.
Passava já de ano e dia…
Mas um dia, por traição,
Caiu nas mãos dos esbirros
E foi levado à prisão.

Algemas de aço nos pulsos,
Vá de insultos ao entrar,
Palavra puxa palavra,
Começaram de falar
- Quanto sabes, seja a bem,
Seja a mal, hás de contá-lo,
- Não sou traidor, nem perjuro;
Sou homem de fé: não falo!
- Fala: ou terás o degredo,
Ou morte a fio de espada.
- Mais vale morrer com honra,
Do que vida deshonrada!

- A ver se falas ou não,
Quando posto na tortura.
- Que importam duros tormentos,
Quando a vontade é mais dura?!

Geme o preso atado ao potro
Já tinha o corpo a sangrar,
Já tinha os membros torcidos
E os tormentos a apertar,
Então o Jaime Rebelo,
Louco de dor, a arquejar,
Juntou as últimas forças
Para não ter que falar.
- Antes que fale emudeça! -
Pôs-se a gritar com voz rouca,
E, cerce, duma dentada,
Cortou a língua na boca.

A turba vil dos esbirros
Ficou na frente, assombrada,
Já da boca não saia
Mais que espuma ensanguentada!

Salazar, cuidas que o Povo
Te suporta, quando cala?
Ninguém te condena mais
Que aquela boca sem fala!

Fantasma da sua dor,
Ainda hoje custa a vê-lo;
A angústia daquelas horas
Não deixa o Jaime Rebelo.
Pescador que se fez homem
Ao vento livre do Mar,
Traz sempre aquela visão
Na sombra dura do olhar,
Sempre de boca apertada,
Como quem não quer falar.

Este poema de Jaime Cortesão circulou clandestinamente nos anos trinta e foi publicado no Avante em 1937 . A publicação de um poema de um republicano sobre um anarquista no jornal comunista inseria-se nos esforços de Francisco Paula de Oliveira /”Pavel” para reforçar uma política de frente popular em Portugal . Sobre Jaime Rebelo veja-se a sua necrologia em Voz Anarquista 1 , 22/1/1975 e César Oliveira , “Jaime Rebelo : Um Homem Para Além do Tempo ” , História , 6 , Março 1995


Wikipédia, a enciclopédia livre.

Jaime Cortesão (c. 1910).

Jaime Zuzarte Cortesão (Ançã, Cantanhede, 29 de Abril de 1884Lisboa, 14 de Agosto de 1960), foi um médico, político, escritor e historiador português. Filho do filólogo António Augusto Cortesão, foi irmão do historiador Armando Cortesão e pai da renomada ecologista Maria Judith Zuzarte Cortesão.


4 comentários:

Marília Gonçalves disse...

Pela igualdade no desporto

petição em linha

http://www.petitiononline.com/mod_perl/signed.cgi?igualfut&1

andrade da silva disse...

O meu comentário a este poema,fi-lo em post. Obrigado Marilia por lembrar que houve fascismo é importante recordar.
abraço
asilva

Marília Gonçalves disse...

Companheiros, Amigos, Leitores

Queria deixar aqui um pedido que faço há anos noutros Sites:
eu dizia com dezasseis anos em
Paris um poema que me tinham passado dactilografado que tinha por nome Maldição, e seguno o que estava escrito o autor era Jaime Cortesao
era uma maldição aparentemente a Salazar poema que fui esquecendo com os anos, mas de que lembro passagens
esse poema dizia:

por ti pelo teu ódio à Liberdade à razão e à verdade
a tudo o que é viril humano e moço
(e aqui há uma lacuna mas diz qualquer coisa parecida com isto)
os homens apodrecem aos milhares no exílio na prisão no calabouço
por ti raivoso abutre
cujo apetite sôfrego se nutre
de lágrimas de gritos de aflições
gemem nas vascas da tortura
os mártires que atiras às prisões

*********

ao ver-te o vulto gélido e felino


mulheres e mães lembrando os lastimosos
casos,de irmãos de filhos e de esposos
bradam crispadas as mãos: assassino, assassino
********************************
e volta repetindo-se nas estrofes o grito de: Maldição, Maldição

ora o que queria pedir era se por acaso alguém conhece este poema e o autor, já que me têm dito que provavelmente não seria de Jaime Cortesão, se o pudessem enviar para o blogue, agradecia, pois gostava muito de o poder dizer ainda
ficaria profundamente reconhecida

Marilia Gonçalves

jaime teixeira mendes disse...

Tenho um manuscrito desse poema mas não está assinado. O meu pai tinha o guardado dentro de um livro
Desconheço também o autor.
Jaime Mendes