sábado, 16 de maio de 2009

No Desespero dos Poetas

nasce revoltosa A Esperança

















A Portugal





Esta é a ditosa pátria minha amada. Não.
Nem é ditosa, porque o não merece.
Nem minha amada, porque é só madrasta.
Nem pátria minha, porque eu não mereço
A pouca sorte de nascido nela.

Nada me prende ou liga a uma baixeza tanta
quanto esse arroto de passadas glórias.
Amigos meus mais caros tenho nela,
saudosamente nela, mas amigos são
por serem meus amigos, e mais nada.

Torpe dejecto de romano império;
babugem de invasões; salsugem porca
de esgoto atlântico; irrisória face
de lama, de cobiça, e de vileza,
de mesquinhez, de fatua ignorância;
terra de escravos, cu pró ar ouvindo
ranger no nevoeiro a nau do Encoberto;
terra de funcionários e de prostitutas,
devotos todos do milagre, castos
nas horas vagas de doença oculta;
terra de heróis a peso de ouro e sangue,
e santos com balcão de secos e molhados
no fundo da virtude; terra triste
à luz do sol calada, arrebicada, pulha,
cheia de afáveis para os estrangeiros
que deixam moedas e transportam pulgas,
oh pulgas lusitanas, pela Europa;
terra de monumentos em que o povo
assina a merda o seu anonimato;
terra-museu em que se vive ainda,
com porcos pela rua, em casas celtiberas;
terra de poetas tão sentimentais
que o cheiro de um sovaco os põe em transe;
terra de pedras esburgadas, secas
como esses sentimentos de oito séculos
de roubos e patrões, barões ou condes;
ó terra de ninguém, ninguém, ninguém:
eu te pertenço. És cabra, és badalhoca,
és mais que cachorra pelo cio,
és peste e fome e guerra e dor de coração.
Eu te pertenço mas seres minha, não


Jorge de Sena




Momentos: Nestes últimos tempos...





Nestes últimos tempos é certo que a esquerda fez erros
Caiu em desmandos confusões praticou injustiças

Mas que diremos da longa tenebrosa e perita
Degradação das coisas que a direita pratica?

Que diremos do lixo do seu luxo - de seu
Viscoso gozo da nata da vida - que diremos
De sua feroz ganância e fria possesão?

Que diremos de sua sábia e tácita injustiça
Que diremos de seus conluios e negócios
E do utilitário uso dos seus ócios?

Que diremos de suas máscaras álibis e pretextos
De suas fintas labirintos e contextos?

Nestes últimos tempos é certo que a esquerda muita vez
Desfigurou as linha do seu rosto

Mas que diremos da meticulosa eficaz expedita
Degradação da vida que a direita pratica?


Sophia de Mello Breyner Andresen


3 comentários:

andrade da silva disse...

ABAIXO A ASQUEROSA PROSTITUIÇÃO DAS INSTITUIÇÕES,VIVA A DEMOCRACIA LIBERTA!

Tão Belas, Sábias e corajosas palavras. Todos devemos recordar que Jorge de Sena num dos seus discursos disse para os tempos de hoje que na actualidade muitos enchiam a barriga e os bolsos como grand ports, mas o grande poeta morreu de fome, o que infelizmente comtiuna a contcer ao que se recusam serem cortesãos.

MAS PORQUE NÂO SOMOS CAPAZES NÒS, OS PORTUGUESES; NÓS, OS EUROPEUS; NÓS,A HUMANIDADE DE DAR A VOLTA A ISTO? SRÁ MESMO PORQUE A ESSÊNCIA DA NATUREZA HUMANA É A PERVERSIDADE?

Será que os ditadores alguns disfarçados de democratas,( de alguns conheço-lhes o rosto, o nome, os textos e a pegada asquerosa de totalitários, desgraçado) têm mesmo razão em considerarem o povo, os eleitores,os ciddãos como um rebanho de carneiros?

Quero pensar que não têm razão, mas...

asolva

Anónimo disse...

CANTATA DA PAZ


Vemos, ouvimos e lemos
Não podemos ignorar
Vemos, ouvimos e lemos
Não podemos ignorar

Vemos, ouvimos e lemos
Relatórios da fome
O caminho da injustiça
A linguagem do terror

A bomba de Hiroshima
Vergonha de nós todos
Reduziu a cinzas
A carne das crianças

D'África e Vietname
Sobe a lamentação
Dos povos destruídos
Dos povos destroçados

Nada pode apagar
O concerto dos gritos
O nosso tempo é
Pecado organizado



Canções Com Aroma de Abril, 1994)



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Segunda-feira, 27 de Abril de 2009
Sophia de Mello Breyner Andresen



CANTATA DA PAZ


Vemos, ouvimos e lemos
Não podemos ignorar
Vemos, ouvimos e lemos
Não podemos ignorar

Vemos, ouvimos e lemos
Relatórios da fome
O caminho da injustiça
A linguagem do terror

A bomba de Hiroshima
Vergonha de nós todos
Reduziu a cinzas
A carne das crianças

D'África e Vietname
Sobe a lamentação
Dos povos destruídos
Dos povos destroçados

Nada pode apagar
O concerto dos gritos
O nosso tempo é
Pecado organizado



(CD Canções Com Aroma de Abril, Strauss, 1994)
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Terça-feira, 1 de Abril de 2008
Sophia de Mello Breyner Andresen

Que poderei de mim mais arrancar



Que poderei de mim mais arrancar
P'ra suportar o dom da tua mão,
Anjo rubro do vento e solidão
Que me trouxeste o espaço,o deus e o mar?

No céu, a linha última das casas
É já azul, alada, imensa e leve.
Nenhum gesto, nenhum destino é breve
Porque em todos estão inquietas asas.

Depois ao pôr do sol ardem as casas,
O céu e o fogo passam pela terra,
E a noite negra vem cheia de brasas
Num crescendo sem fim que nos desterra.
Poesia por Poemas & Poetas em Terça-feira, Abril 01, 2008 Hiperligações para esta mensagem 0 comentários Etiquetas: Sophia de Mello Breyner Andresen - Poemas
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Sophia de Mello Breyner Andresen

Pátria

Por um país de pedra e vento duro
Por um país de luz perfeita e clara
Pelo negro da terra e pelo branco do muro

Pelos rostos de silêncio e de paciência
Que a miséria longamente desenhou
Rente aos ossos com toda a exactidão
Do longo relatório irrecusável

E pelos rostos iguais ao sol e ao vento
E pela limpidez das tão amadas
Palavras sempre ditas com paixão
Pela cor e pelo peso das palavras
Pelo concreto silêncio limpo das palavras
Donde se erguem as coisas nomeadas
Pela nudez das palavras deslumbradas

- Pedra rio vento casa
Pranto dia canto alento
Espaço raiz e água
Ó minha pátria e meu centro

Me dói a lua me soluça o mar
E o exílio se inscreve em pleno tempo


Esta gente

Esta gente cujo rosto
Às vezes luminoso
E outras vezes tosco

Ora me lembra escravos
Ora me lembra reis

Faz renascer meu gosto
De luta e de combate
Contra o abutre e a cobra
O porco e o milhafre

Pois a gente que tem
O rosto desenhado
Por paciência e fome
Um país ocupado
escreve o seu nome

E em frente desta gente
Ignorada e pisada
Como a pedra do chão
E mais do que a pedra
Humilhada e calcada

Meu canto se renova
E recomeço a busca
Dum país liberto
Duma vida limpa
E dum tempo justo

Marília Gonçalves disse...

Abril onde estão os teus Caminhos?

Marília


Sophia de Mello Breyner

Poema de Sophia de Mello Breyner

« Esta é a madrugada que eu esperava

O dia inicial inteiro e limpo

Onde emergimos da noite e do silêncio

E livres habitamos a substância do tempo »