Dórdio Gomes, Pintor Alentejano
Imagem obtida na internet
Bendito seja o meu nome!
Semeio e colho este pão,
mas só migalhas me dão,
enganando a minha fome.
Zé-povinho assim me chama
quem de mim se não reclama!
Arautos de feira exultam.
E com palavrinhas mansas
e falazes esperanças,
o meu dia a dia insultam.
Zé-povinho assim me chama
quem de mim se não reclama!
Quem me promete o que é meu,
como se fosse oferenda?
Quem supõe que estou à venda?
Quem é aqui mais do que eu?
Zé-povinho assim me chama
quem de mim se não reclama!
Da noite dos tempos venho,
vergado, chapéu na mão,
à deriva como um lenho
sem velame nem timão.
Zé-povinho assim me chama
quem de mim se não reclama!
Milénios já percorridos
de sofrimento e lições,
quando os terei aprendidos
por memória e por razões?
Zé-povinho assim me chama
quem de mim se não reclama!
Continuo um pé descalço,
um deserdado, a ralé,
a subir ao cadafalso
num qualquer auto de fé...
Zé-povinho assim me chama
quem de mim se não reclama!
Enredado em várias malhas
e presa dos maiores danos,
morro em todas as batalhas
só p'ra mudar de tiranos!
Zé-povinho assim me chama
quem de mim se não reclama!
Ah, que força, que arreganho
assim me tolhe a vontade
de me erguer e com verdade
ser livre e do meu tamanho?!
Até mudar de caminho,
serei sempre o Zé-povinho?
José-Augusto de Carvalho
Redigido em 21.03.1996/Corrigido em 30.10.2009
Viana * Évora * Portugal
2 comentários:
Caro Companheiro
apenas enquanto o Zé o permitir...
esperemos que a paciência não seja de mais meio século
abraço
Marilia Gonçalves
A grande Marcha da Humanidade é por caminhos ora ásperos, ora pantanosos e dura há milénios. Chegar ao termo da estrada e sorrir a um final feliz é o objectivo, mas prever o como e o quando é exercício a que não me arrisco.
Grato pelo comentário.
J-A
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