domingo, 1 de novembro de 2009

05 - POEMÁRIO * A verdade de mim!


Dórdio Gomes, Pintor Alentejano

Imagem obtida na internet





Bendito seja o meu nome!
Semeio e colho este pão,
mas só migalhas me dão,
enganando a minha fome.


Zé-povinho assim me chama
quem de mim se não reclama!


Arautos de feira exultam.
E com palavrinhas mansas
e falazes esperanças,
o meu dia a dia insultam.


Zé-povinho assim me chama
quem de mim se não reclama!


Quem me promete o que é meu,
como se fosse oferenda?
Quem supõe que estou à venda?
Quem é aqui mais do que eu?


Zé-povinho assim me chama
quem de mim se não reclama!



Da noite dos tempos venho,
vergado, chapéu na mão,
à deriva como um lenho
sem velame nem timão.


Zé-povinho assim me chama
quem de mim se não reclama!


Milénios já percorridos
de sofrimento e lições,
quando os terei aprendidos
por memória e por razões?


Zé-povinho assim me chama
quem de mim se não reclama!


Continuo um pé descalço,
um deserdado, a ralé,
a subir ao cadafalso
num qualquer auto de fé...


Zé-povinho assim me chama
quem de mim se não reclama!


Enredado em várias malhas
e presa dos maiores danos,
morro em todas as batalhas
só p'ra mudar de tiranos!


Zé-povinho assim me chama
quem de mim se não reclama!


Ah, que força, que arreganho
assim me tolhe a vontade
de me erguer e com verdade
ser livre e do meu tamanho?!


Até mudar de caminho,
serei sempre o Zé-povinho?



José-Augusto de Carvalho
Redigido em 21.03.1996/Corrigido em 30.10.2009
Viana * Évora * Portugal

2 comentários:

Marília Gonçalves disse...

Caro Companheiro

apenas enquanto o Zé o permitir...
esperemos que a paciência não seja de mais meio século
abraço

Marilia Gonçalves

José-Augusto de Carvalho disse...

A grande Marcha da Humanidade é por caminhos ora ásperos, ora pantanosos e dura há milénios. Chegar ao termo da estrada e sorrir a um final feliz é o objectivo, mas prever o como e o quando é exercício a que não me arrisco.
Grato pelo comentário.
J-A